Scott Snyder ficou conhecido principalmente por seu trabalho na DC Comics nominalmente na linha e no título principal do Batman nos últimos anos. O roteirista consolidou uma sólida base de fãs escrevendo arcos seguros e histórias bem estruturadas, apesar de nada revolucionárias.
Wytches é o novo título autoral de Snyder lançado este mês pela Image Comics. A edição de estréia nos apresenta à família Rooks, que após um trágico episódio de
bullying envolvendo a filha única do casal chamada Sailor, se muda para uma nova cidade e se depara com horrores e fantasmas de suas decisões passadas.
A sinopse e a premissa parecem bem sem graça (assim como a maioria das premissas dos trabalhos de Snyder), mas a primeira edição de Wytches é conduzida com um ritmo tão específico e envolvente e o suspense e o horror se fundem de maneira tão completa que fica impossível dizer algo negativo sobre este roteiro. No universo de Wytches, pessoas por todo o globo durante séculos de humanidade foram presas, torturadas, humilhadas e assassinadas sob a acusação de bruxaria. No entanto, estas pessoas eram somente emissários e guardiões de um terrível segredo, as verdadeiras entidades místicas classificadas como “bruxas” são algo muito pior.
Snyder nos oferece amostras deste horror em doses homeopáticas e pontuais, mas não menos brutais nesta primeira edição, o que aumenta o interesse na leitura e aproxima este roteiro muito mais de uma adaptação cinematográfica do que de uma HQ de fato. 80% do roteiro de Wytches aqui envolve a re-adaptação de Sailor e sua família após o terrível evento que os obrigou a se mudar. A adolescente é mostrada como protagonista, vítima e ao mesmo tempo objeto central na trama que remonta a eventos de um passado obscuro. O principal mérito de Wytches é que a HQ tem um clima muito ruim durante todas as suas 23 páginas. Se você já teve algum episódio parecido com os mostrados aqui o arco inicial remonta lembranças vívidas e desagradáveis e faz desta uma leitura com um clima extremamente pesado. Se você é um fã de horror e consegue se imaginar neste tipo de situação o roteiro é perfeito e a arte…
Jock é o responsável pela arte em Wytches e Scott Snyder não poderia ter escolhido um ilustrador mais adequado. Tendo em vista que o roteiro é muito simples e sutil, 90% do clima da HQ é estabelecido pelo trabalho gráfico. As páginas em Wytches tem um visual mórbido, bruto, sombrio, rústico, visceral mas principalmente artesanal. Este talvez este seja o aspecto mais marcante da arte da HQ. Parece que a arte foi feita em uma mesa de madeira em uma cabana velha sob a luz de velas. O cuidado com o traço, a fotografia meio torta e o visual e caracterização com um clima proibido e ancestral elevam o roteiro de uma simples trama de terror a uma puta HQ sobre tragédia e desgraça. As florestas decadentes e misteriosas são o destaque visual em Wytches e eu nunca tinha visto um artista com tanto esmero e criatividade para desenhar árvores.
Wytches foi projetada para agradar os fãs de HQs de horror. A premissa é sutil, simples e envolta em mistério ancestral. O elenco é pequeno e totalmente traumatizado por eventos horríveis de um passado que os persegue a todo momento. O local onde a HQ se passa é perfeito. A arte, que oscila entre momentos de extrema violência visual, podridão, maldade e passagens melancólicas e deprimentes, deixa o clima da leitura extremamente ruim. Isso é tudo que um fã de horror clássico poderia esperar. Wytches desde o seu início até o seu texto final (escrito com um tom muito pessoal pelo próprio Snyder) é feita para fazer você se sentir mal e querer se sentir pior ainda. Pra mim esta é a síntese do horror e os autores aqui podem considerar sua missão cumprida com louvor.